segunda-feira, 15 de junho de 2015

O Hospital


Jango entrou no grande hospital, e subiu de elevador até o terceiro andar. Andou um pouco a esmo, com a cabeça ainda cansada da noite anterior. Não conseguia se localizar bem nos vastos corredores brancos - ainda que frequentasse o hospital desde menino. De vez em quando, passavam apressadamente por ele lindas estagiárias vestidas em uniformes brancos. Seu desejo clamava fervorosamente por seus cuidados. Os médicos, enfermeiros e funcionários dali lhe pareciam todos mais saudáveis psicologicamente do que ele, isolados que estavam naquele templo de cura, ausentes do espetáculo social.

Herói; era essa a palavra que Jango lia no rosto de cada um deles. “O sentido da existência, para esses inabaláveis curandeiros, é a conservação da existência alheia. Os instintos egoístas, que afligem a maioria das pessoas diariamente, não deve abalar o senso de dever dos médicos e seus assistentes”, pensava com seus botões enquanto não encontrava o departamento cirúrgico. “Os meus regimes de auto-destruição, perversão e sadismo não assustam a esse exército de heróis convictos, determinados a combater a morte a qualquer custo.” tais eram os pensamentos que lhe ocorriam. Jango sentia uma espécie de glória melancólica pairando no silêncio dos corredores.

A serenidade do recinto parecia neutralizar sua mente, ainda nervosa e obscurecida pelos excessos da noite anterior. Chegou enfim à ala cirúrgica, onde foi encaminhado a uma enfermeira de lindos olhos azuis e sotaque nordestino. Ela entregou a ele um daqueles coletes abertos na parte de trás, igual ele sempre via nos filmes, e pediu para que se trocasse no vestiário. Ao andar pelo departamento cirúrgico com o colete verde-claro e uma touca na cabeça, Jango se sentiu pouco respeitável. Suas bolas se recolheram ao toque do ar frio de inverno. Desistiu de manter alguma compostura e se deitou de costas na cama de operações, para que o médico pudesse cortar a pinta volumosa em sua nuca.