quarta-feira, 6 de abril de 2016

A Panhoca 2011

Todos os olhos se voltaram aos meus olhos vermelhos, porque eu tinha esquecido de pesar a panhoca de frango. A moça do caixa ja suspirava só de olhar praquela panhoca sem preço, e eu querendo comê-la desesperadamente. Um gerente veio me olhando com a cara vermelha, contorcida de ódio, e expeliu um comentário aos colegas: olhem, uma tartaruga. Alguns funcionários riram e pediram desculpas. Eu estava demasiado faminto e fora de contexto para me sentir humilhado. Ainda assim, sabia que eles queriam me eliminar. Não era paranóia, ou crise de pânico; era real, eu podia sentir o cheiro de ódio no ar do supermercado. Às vezes, as coisas saem totalmente do controle por um breve espaço de tempo, e nós não percebemos por auto-defesa instintiva. Eu percebia. O homem vermelho não parecia ter muito tempo de vida. Ele passara aquele domingo assistindo ao Faustão com os filhos em seu sofá, esquecido de que no dia seguinte teria que auxiliar homens drogados a pesarem seus pães. Sua vida era uma sucessão de mortes - isso eu pude perceber nos seus gestos, indiferentes à dúvida que eu tinha na minha cabeça - aonde é que pesa a panhoca, caralho? Eu deixei eles saírem vencendo dessa. Saí da fila, voltei ao fundo do supermercado, pesei a panhoca e fui embora.